Edna Lautert

Faço do tempo um elemento na eterna tentativa de construir uma vida com mais graça e com mais cor.



quarta-feira, 29 de junho de 2011

ROSEIRAL


Havia um tempo, no Roseiral, em que tudo era frieza, e as confusões humanas aumentavam. A desculpa era que o amor adoecera, e que a fraternidade não merecia mais crédito. 
Os humanos viviam em constante flagelo na alma, pois não conseguiam ouvir os sinais do amor em meio à multidão. Repensá-lo tornou-se uma meta difícil.
Devido ao turbilhão de vozes e aos milhares de pares de mãos acenando, as escolhas, muitas vezes, eram equivocadas. Dava-se crédito a bens materiais, e a pessoas que pregavam o fim da paz e da sobriedade. As mãos que acenavam eram mãos que confundiam o olhar, por serem belas e delicadas, mas na verdade serviam como alucinógenos para quem não enxergava mais com o coração: vencia a futilidade, a ganância, o ego, a falta de pudor, o abandono, e o mundo transformava-se em um estranho espinhadeiro.
Não muito longe, porém, gritos de liberdade ecoavam pelos campos e chegavam ao Roseiral: eram vozes daqueles que ainda ousavam acreditar no amor e no seu renascimento diário. Eram os loucos que alimentavam os famintos do vilarejo das Trevas. E que a cada dia plantavam uma semente para florescer no futuro, enquanto a humanidade não encontrava a existência plena, por não ouvir seus próprios sentimentos.

A falência da ética

Conta à lenda que há alguns anos os líderes do céu e do inferno estiveram reunidos para convocar uma assembléia geral. Queriam discutir sobre o futuro de um País de carnaval chamado Brasil. Chegar a um entendimento para promover a ordem. E, caso o tempo permitisse, promover uma mudança de cardápio: queriam trocar a pizza, recheada de gordura trans, para uma dieta mais light. Isso porque estava constatado que o excesso de pizza era a causa do aumento de peso registrado na população. Mas vejam bem, essa comilança de pizza não possuía co-relação com o fato de o País viver inundado em podridão não.
O líder do inferno decidiu impor algumas regras, como não queria que nada desse certo,  caprichou nas condições: para existir a assembléia, nesse dia seria proibido mentir, ludibriar, enganar, roubar, desviar dinheiro público, andar com a mulher do vizinho, paquerar a melhor amiga da esposa, roubar doces no caixa do supermercado, enganar criancinhas ou pega-las no colo para garantir votos, e por ai vai.
O líder do céu preparou a minuta do acordo. Mas, como os funcionários do inferno estavam em greve por falta de pagamento, a assinatura teve que esperar para o dia seguinte. Um amigo do amigo do oficial de despacho acabou comentando o assunto. E os termos do acordo foram parar nas mãos da imprensa. Que lascou a notícia em primeira mão.
E, foi aí que tudo aconteceu: lideranças de todo o Brasil estavam mobilizadas para participar da assembléia. Mas, ao saberem das condições do acordo, resolveram boicotar o evento, antes mesmo de ele começar. Deflagrou-se uma greve geral no País e, a partir deste dia, morreu a ética, a vergonha, o respeito, o caráter, a moral.
Alguns movimentos de resistência sobreviveram, enquanto o País lança, a cada dia, uma pizza de novo sabor.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Poema de um dia só

Te descrevo
Te vivo
Te sonho,
e do sonho faço minha ilusão;
e da ilusão o eterno despertar da minha alma,
no tão aflito amor que me estremece a carne.

(Coleção Poemas de Amor - editora Rio Pretense - 2002)

AUSÊNCIA

A noite sem você tem várias faces...

Face estranha...

como a esperança.

Desesperadora...
Como a saudade.

Nostálgica...
Como a solidão.

Silenciosa...

Como uma lágrima!


(Poesia premiada no concurso Poema nos ônibus, em 1996).

Cantar de Amor


Dentro da noite, ouço uma canção...
que fala de amor,  embala a esperança...
traz o meu  sonho,  vaga lembrança
a tua imagem...meu coração.

Dentro da noite, tu te aproximas...
visto a meiguice, deste teu olhar...
sonho com as horas, vou contando todas...
embalando sonhos...neste eterno amar.

Dentro da noite tua voz macia
a lua irradia esse brilho teu...
já nem sou mais minha...
nem pertenço ao mundo
nesse amor profundo...
luz dos dias meus.

Espelhos

Visto-me de sombras
e o mundo me parece vazio, desabitado.
uma dor latente
sai do coração,
e acena, pela janela de minha alma.

Triste solidão dos dias meus,
distantes do teu olhar.

A vida que me cerca não tem alegria,
é como um desenho, inanimado,
e no espelho de mim mesma não há reflexo,
mas imagens distorcidas.

Não sou, não existo, não penso...
Fiquei parada no tempo do teu olhar.

POEMA PARA O SOL


Quando o dia amanhece,
pálida luz enfeita a janela dos meus sonhos...
e me faz ditar versos, que nem sempre são escritos
e rabiscar planos que talvez, só talvez...
serão vividos.

Quando o dia se faz meio,
a luz explode...
e dentro dela dançam arremedos de uma vida,
são os fantasmas, objetos que se movem,
teimando ao tempo a identidade adormecida.

E quando a tarde cai e a lua nasce...
a namorada, separada de seu sol...
o universo testemunha um recomeço,
ou um tropeço, indicando o fim de tudo.

SOLIDÃO

O vento levou para longe...
não restou poeira, só estrada.
Relva, molhada
Abismo...distância
Mudança de estação.
A vida que passa na janela, e não tem morada...
simplesmente passa..vai embora...
Não restou nada.

(Edna Lautert)